quarta-feira, 30 de maio de 2012

Plano Nacional de Educação II: outra vez a montanha parirá um rato?


O contexto educacional brasileiro, no início dessa segunda década do século XXI, está focado nos debates acerca da tramitação do Projeto de Lei (PL) 8035/2010, que aprova o novo Plano Nacional de Educação (PNE) e cuja duração será de dez anos. Tal contexto é evidente uma vez que estamos debatendo a aprovação do nosso segundo PNE que tentará corrigir ou, na melhor das hipóteses, diminuir as dívidas históricas que o Brasil tem com a educação. Na primeira década do século XXI, supostos avanços na educação brasileira foram alardeados aos quatro ventos pela mídia e pelos governos. Ao usar o adjetivo “supostos” não se pretende, caro leitor, fazer nenhum tipo de demérito a nenhuma esfera governamental da federação, mas apenas fundamentar a opinião aqui exposta e contraditar algumas das informações disponibilizadas sobre o assunto. Publicidade institucional do Governo Federal divulga o crescimento da oferta de vagas na educação infantil através do programa Pró-Infância que, diga-se de passagem, tem escolas com prédios belíssimos. Contudo não há financiamento suficiente para os municípios arcarem com as despesas de custeio de tais obras e as seis mil unidades anunciadas pelo governo federal para os próximos quatro anos estão perto de equacionar o problema, mas resolver a questão é um horizonte muito distante. Alardeado o crescimento do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), não significa muita coisa quando analisamos índices de reprovação e evasão. Segundo avaliação publicada pela Câmara dos Deputados (CD), a evasão aumentou em relação aos índices do inicio da década. Os dados apresentados pela Comissão de Educação e Cultura (CEC) da Câmara dos Deputados mostram que, em 2000, a taxa de evasão era de 4,9% e em 2005 chegava a 6,9%. Além disso, o IDEB não é um indicador suficientemente confiável, pois não cruza dados de infraestrutura e formação profissional, por exemplo. O aumento de vagas em cursos superiores se deve, sim, a programas do Governo Federal como PROUNI e SISU, por exemplo. Mas cabe ser dito que esses dois programas juntos não respondem sozinhos pelo aumento de matrículas no ensino superior. Considerável é o aumento de possibilidades de financiamento e
aquisição de créditos universitários a longo prazo e a juros baixíssimos nas instituições privadas de ensino superior, bem como a oferta privada de cursos na modalidade de educação à distância (EAD), o que contribuiu significativamente para o aumento no número de matrículas. Ainda no ensino superior, o texto do PL 8035/2010 deixa claro que, na visão do MEC, a qualidade da oferta é perseguida através da disponibilidade de insumos como, por exemplo, um aumento no número de mestres e doutores. Assim, entende-se que a qualidade é alcançada através da busca de insumos de qualidade. Mas essa lógica não aparece nas metas da educação básica. Nas metas e estratégias destinadas à educação básica fica claro que o MEC entende que devemos primeiro expandir o acesso para depois buscarmos qualidade. Ora, isso é um forte indício de que o PNE I - aprovado em 09 de Janeiro de 2001- não teve suas metas cumpridas e configurou-se um verdadeiro fracasso. Dez anos depois, o Brasil ainda se preocupa com a expansão do atendimento da educação básica e da escola de tempo integral e alija-se do debate dos insumos necessários à qualidade da educação ofertada. O que temos na proposta de Novo PNE é um aumento de 50% na oferta de escolas de tempo integral, aumento na oferta de vagas em educação infantil, entre outras metas que se repetem. Na prática, muitas metas não foram cumpridas pelos governos que se sucederam à aprovação do PNE I. Há quem atribua o fracasso do PNE I aos vetos presidenciais para as metas relativas ao orçamento. Cabe lembrar aos menos avisados que, no momento da aprovação do PNE I, já estava em vigor a tão popularizada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que limitou os gastos dos governos em todas as esferas federativas, substituindo a Lei Camata. Além disso, os gastos resultantes com a aprovação do PNE I, lá em 2001, não estavam previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), em vigor na época, nem no Plano Pluri Anual (PPA). Em 2002, o Governo Federal, mesmo tendo a oportunidade de fazer um novo PPA e reorganizar a LDO e, mesmo tendo a maioria no Congresso Nacional, não derrubou os vetos do Presidente que o antecedeu. Dessa forma, não só os vetos às metas orçamentárias, como também o desinteresse dos governos que se sucederam, para com a situação, contribuíram para o não cumprimento de diversas previsões do PNE I. Além dos vetos e do descompromisso da União para com o PNE I, outro fator importantíssimo contribuiu para o não cumprimento das metas e ainda pode determinar o insucesso do PNE II: a distribuição dos recursos no Brasil é extremamente injusta para com os municípios. Dados do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) de 2010 demonstram que os municípios têm a sua disposição somente 18% do total do bolo orçamentário para investir em educação, mas que são responsáveis por 39% do total de gastos públicos com educação no Brasil. Dados da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) mostram que de 2001 a 2005 a União reduziu sua participação no investimento público em educação de 16,8% para 15,8% enquanto que os municípios aumentaram sua participação de 37% para 42,2%, sem que isso representasse aumento de receitas ou repasses. Em 2010, criou-se um amplo movimento social denominado Conferência Nacional de Educação (CONAE) para consultar a comunidade educacional e demais setores da sociedade civil a respeito das necessidades educacionais brasileiras. Esse movimento foi “a verdadeira montanha que pariu um rato”8. Depois de meses de organização de CONAEs municipais, regionais, estaduais e a etapa final em Brasília em Março de 2010, o Governo Federal mandou ao Congresso Federal um Projeto de Lei com o número 8035/2010 que desconsiderava brutalmente diversos apontamentos feitos pela população. Entre eles o percentual de investimentos em relação ao PIB. A CONAE apontou 10% de investimento ao _m da década e o governo autorizou 7%. Ingênuos foram os que acreditaram que seriam acatadas todas as demandas apontadas no documento final da CONAE. Ingênuos, pois em primeiro lugar a Constituição Federal é clara ao dizer: Fácil é de entender que não seria uma consulta pública que redigiria o novo PNE. Leitura do artigo 214, articulada com o artigo 22 inciso XXIV da CF, nos esclarece um pouco mais: Assim, fica claro que o Governo Federal tinha prerrogativa constitucional de definir o que ele achava que deveria ser o PNE. A novidade estava somente na consulta à população, mas que, por _m, frustrou todos os setores envolvidos. Muito mais avançada e eficaz foi a Emenda Constitucional 59/2009 que trouxe novidades como o _m da Desvinculação das Receitas da União (DRU) para investimento em educação e a ampliação da escolaridade obrigatória que passa a ser entre 04 e 17 anos. A realidade é que brigar por 10% do PIB em educação (como quer o movimento social para o novo PNE) não basta. Relatório sobre o PNE apresentado pelo Deputado Vanhoni (PT-PR) aponta uma previsão de investimento de 8.79% do PIB, mas não diferencia investimento direto de investimento total. O primeiro significa investir todo esse percentual em educação pública. Seria o ideal. O segundo significa contabilizar bolsas e investimentos em instituições privadas. Além disso, não deixa claro, mais uma vez, qual ente federado faz o quê e quanto isso vai custar. Tampouco responsabiliza quem não cumprir as metas. O que, num país altamente fisiologista e sem tradição de respeito à ética e ao bem público, permite, na prática, que os entes subfederados se eximam de responsabilidade, uma vez que há meta a ser cumprida, mas não há recurso para tal, nem penalidade para quem não a cumprir. Correto é afirmar que as esperanças de o Brasil ser grande, como uma sexta economia merece, estão todas plantadas na educação. Porém, não só de investimento proporcional ao PIB nós precisamos. Precisamos, ainda, é descentralizar os recursos que ficam todos presos na mão do Governo Federal, programas de valorização da carreira (a Lei do Piso já é um grande avanço), avaliação externa em todas as instituições educacionais, discutir e aplicar ações que conjuguem qualidade e acesso, responsabilização aos gestores pelo não cumprimento das metas e políticas de Estado para educação, assim como fizemos na economia. Estamos longe de alcançar patamares finlandeses. Meu receio é que, outra vez, a montanha dê a luz a um novo rato.



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